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Global Circularity Protocol: O novo padrão global para medir e comunicar a circularidade nas empresas

Global Circularity Protocol
Source: GCP – WBCSD https://solutions.wbcsd.org/publication/global-circularity-protocol-for-business/

A economia circular deixou de ser uma aspiração distante para se tornar uma prioridade estratégica nas agendas corporativas. Contudo, a ausência de uma linguagem comum e de métricas harmonizadas tem dificultado a comparação, o investimento e a aceleração desta transição à escala global.

É precisamente essa lacuna que o Global Circularity Protocol for Business (GCP) vem preencher.

Publicado em novembro de 2025 pela World Business Council for Sustainable Development (WBCSD) e pela One Planet Network (hospedada pela UNEP), o GCP v1.0 representa um marco histórico: o primeiro framework global e voluntário que oferece às organizações uma abordagem padronizada para medir, gerir e comunicar o seu desempenho circular e respetivos impactos.

Para quem é este protocolo?

O GCP foi desenhado para organizações de todos os tamanhos, setores e geografias — desde multinacionais a PMEs, independentemente da sua maturidade em circularidade.

Seja uma empresa que está a dar os primeiros passos na economia circular, seja uma organização avançada que procura reportar de forma credível aos seus stakeholders, o GCP oferece orientações flexíveis e modulares adaptadas a diferentes contextos e capacidades.

Os destinatários incluem:

  • Reguladores e policymakers que precisam de informação credível para desenhar políticas públicas
  • Equipas de sustentabilidade e circularidade que precisam de medir e reportar progressos
  • Decisores estratégicos que procuram integrar a circularidade na gestão de risco e na criação de valor
  • Profissionais de procurement e supply chain focados em resiliência e redução de dependêcias
  • Investidores e financiadores que necessitam de dados comparáveis para avaliar desempenho

Os benefícios são claros (e quantificáveis)

O GCP não é apenas mais um framework. A análise de impacto publicada pela WBCSD e OPN demonstra o potencial transformador da sua adoção generalizada:

  • Pupança de materiais: Redução cumulativa global de 100-120 mil milhões de toneladas de materiais até 1050 (equivalente a um ano de consumo global atual)
  • Impacto climático: Potencial de evitar 67-76 gigatoneladas de CO₂ equivalente entre 2026 e 2050 (cerca de 1,3x-1,5x as emissões globais anuais atuais)
  • Impacto na natureza: Redução anual de 11-12% na poluição por PM₂.₅ no mesmo período
  • Aceleração da maturidade: A adoção do GCP pode duplicar o ritmo a que as empresas atingem níveis avançados de maturidade circular

Mas há mais benefícios práticos e imediatos para as organizações:

  • Redução de custos operacionais através da eficiência material e gestão de resíduos
  • Mitigação de riscos relacionados com escassez de recursos, volatilidade de preços e disruções na cadeia de abastecimento
  • Acesso facilitado a capital através de dados comparáveis e alinhados com frameworks ESG
  • Diferenciação competitiva e reforço reputacional junto de clientes, investidores e reguladores
  • Conformidade antecipada com regulamentação emergente (ESPR, PPWR, CSRD, etc.)

Como funciona: a jornada em 5 etapas


O GCP propõe uma abordagem estruturada mas flexível, organizada em cinco estágios que orientam as organizações desde a definição de objetivos até à comunicação externa:

Defina o propósito da avaliação e identifique os stakeholders relevantes.
Perguntas-chave:
Qual é o nosso objetivo? Reporte externo? Gestão de risco? Steering interno?
A que nível vamos avaliar? Material, produto ou organização?Quem precisa desta informação?

Mapeie a cadeia de valor, identifique hotspots de circularidade e determine os impactos, riscos e oportunidades (IROs) materiais.

Inclui:

  • Definição de fronteiras organizacionais e operacionais
  • Mapeamento da cadeia de valor e identificação de stakeholders
  • Avaliação de materialidade (dupla materialidade)
  • Identificação e priorização de fluxos materiais relevantes

Selecione indicadores alinhados com os seus objetivos e recolha dados para cálculo.

O GCP organiza os indicadores em 4 módulos:

Close the Loop:

  • % Circular Inflow (materiais secundários ou renováveis)
  • % Circular Outflow (potencial e recuperação efetiva)
  • % Material Circularity (indicador agregado)

Narrow & Slow the Loop:

  • Desmaterialização (absoluta e relativa)
  • Tempo de vida útil dos produtos

Value the Loop:

  • Produtividade material circular
  • Receita gerada por circularidade

Impact of the Loop:

  • Impacto em GEE, natureza e dimensão social

Analise resultados, priorize ações e desenvolva roadmaps concretos.

Passos críticos:

  • Contextualizar os resultados e identificar padrões
  • Avaliar trade-offs e sinergias com outros objetivos de sustentabilidade
  • Definir targets SMART e planos de ação
  • Estabelecer governance robusta para circularidade

Prepare divulgações alinhadas com frameworks existentes (GRI, ESRS, IFRS S1/S2, TNFD).

Princípios fundamentais:

  • Relevância (foco em questões materiais)
  • Representação fiel (completa, neutra e precisa)
  • Comparabilidade (ao longo do tempo e entre organizações)
  • Transparência (metodologias e fontes claramente divulgadas)

Uma abordagem progressiva e inclusiva

O GCP reconhece que as organizações partem de pontos de maturidade diferentes. Por isso, propõe três níveis de utilização progressivos:

Nível 1 – Iniciação

Organizações que começam a medir desempenho circular, focando-se em fluxos materiais sob controlo direto e em pelo menos 1 métrica core.

Nível 2 – Expansão

Organizações que ampliam o âmbito, incluem stakeholders na definição de IROs e adotam todas as métricas core.

Nível 3 – Consolidação

Organizações com dados robustos ao longo da cadeia de valor, que incluem fluxos sob controlo indireto e métricas de impacto.

Esta flexibilidade permite começar pequeno (num produto, num material) e escalar progressivamente até ao reporte organizacional completo.

Interoperabilidade: o GCP não substitui, complementa

Um dos pontos fortes do GCP é a sua interoperabilidade com frameworks já estabelecidos:

  • GRI (Global Reporting Initiative)
  • ESRS (European Sustainability Reporting Standards)
  • IFRS S1/S2 (International Financial Reporting Standards)
  • TNFD (Taskforce on Nature-related Financial Disclosures)
  • GHG Protocol
  • ISO 59020 e ISO 59004

Isto significa que as organizações podem usar o GCP para gerar dados consistentes que alimentam múltiplos canais de reporte, reduzindo duplicação de esforços e aumentando a consistência entre diferentes obrigações de divulgação.

Governação credível e multi-stakeholder

O desenvolvimento do GCP envolveu mais de 80 organizações e 150+ especialistas de empresas, academia, think tanks, ONGs e governos, garantindo rigor científico e aplicabilidade prática.

Três comités de aconselhamento (Business, Policy e Scientific Advisory Committees) asseguraram independência e credibilidade técnica ao longo de um processo iterativo de dois anos.

O que vem a seguir?

O GCP v1.0 é um ponto de partida, não uma linha de chegada. Futuras iterações irão expandir o âmbito e aprofundar metodologias, incluindo:

  • Framework de políticas públicas para circularidade
  • Metodologia de Science-Based Targets para circularidade
  • Módulo “Clean the Loop” focado em poluição e toxicidade
  • Indicadores financeiros adicionais para investidores
  • Orientações setoriais específicas
  • Ferramentas digitais e bases de dados de benchmarking

A WBCSD e a One Planet Network convidam todas as organizações a testar o protocolo, partilhar feedback e contribuir para o seu refinamento, garantindo que evolui de forma relevante, prática e globalmente aplicável.

Conclusão: a mudança sistémica começa com linguagem comum

Tal como o GHG Protocol se tornou a referência global para contabilização de emissões de carbono, o GCP tem a ambição de se tornar o padrão de referência para medir e comunicar desempenho circular.

Numa altura em que a extração e processamento de materiais representam mais de 55% das emissões globais de GEE e mais de 90% dos impactos em biodiversidade e stress hídrico, a transição para uma economia circular já não é opcional.

É uma questão de competitividade, resiliência e responsabilidade.

O GCP oferece às organizações as ferramentas para transformar ambição em ação, circularidade em valor mensurável, e dados fragmentados em inteligência estratégica.

A economia circular precisa de uma linguagem comum. Essa linguagem chegou.


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